quinta-feira, 28 de julho de 2011

A Confederação do Equador

Por Multirio

A dissolução da Assembléia de 1823 e a outorga da Constituição de 1824 geraram de imediato uma violenta reação na província de Pernambuco. As Câmaras Municipais de Olinda e de Recife já haviam negado aprovação àqueles atos do imperador alegando que assim agiam movidas pela "desconfiança não pequena em que se acham todos os habitantes desta província, receando o restabelecimento do antigo e sempre detestável despotismo, a que estão dispostos a resistir corajosamente".


Este descontentamento também já atingia outras províncias no Norte e no Nordeste do Brasil. Nelas, avolumavam-se os comentários de que o Rio de Janeiro havia se transformado numa "nova Lisboa" dominada por portugueses que oprimiam e prejudicavam os brasileiros. Na província de Pernambuco - em Recife, especialmente - a crença generalizada de que os portugueses exploravam os "patriotas pernambucanos" teria sido um dos motivos que deflagrara a Revolução Pernambucana de 1817.

Recife, cenário de descontentamentos que originaram a Confederação do Equador.
Não era por acaso que pelas ruas de Recife circulava esta quadrinha:
"Sem grande corte na Corte Não se goza um bem geral; Que o corte é que nos faz bem, A Corte, é quem nos faz mal."
Em meio a isto tudo renasceria em Pernambuco, nos primeiros anos do Governo de D. Pedro I, um sentimento nativista inspirado no episódio das invasões holandesas da região no século XVII. Agora, este sentimento retornava temperado pela divulgação, e até mesmo encampação, das idéias liberais européias.

Cipriano Barata

As idéias liberais ganharam ímpeto a partir da presença e da atuação, no Recife, do político e jornalista baiano Cipriano José Barata de Almeida que retornava da Europa. Apesar de formado em medicina, pela Universidade de Coimbra, passou a maior parte de sua vida dedicado às atividades políticas.

Cipriano Barata era, segundo o historiador Amaro Quintas, (...) "irriquieto e combativo". Constava inclusive que por repudiar traços de qualquer outra Metrópole, usava roupas feitas apenas com tecidos do Brasil. Era também conhecido como "homem de todas as revoluções" pois estivera na Conjuração Baiana de 1798 e na Revolução Pernambucana de 1817.

A partir de 1823 começara a publicar um periódico chamado Sentinela da Liberdade. Por meio da nascente imprensa - que veiculava críticas e propostas políticas incentivando e envaidecendo uns, preocupando e descontentando outros - Cipriano Barata hostilizava o Governo imperial. Utilizando um texto combativo e agressivo, posicionava-se a favor das idéias republicanas e da autonomia das províncias. Por essa razão foi detido na fortaleza de Brum, em Pernambuco, em 17 de novembro de 1823.

Preso, desagradando e inquietando a muitos, continuou opondo-se ao Governo escrevendo outro jornal, dando-lhe o nome de: "Sentinela da Liberdade na Guarita de Pernambuco, atacada e presa na fortaleza de Brum por ordem da força armada reunida." Transferido, posteriormente, para o Rio de Janeiro acabaria passando por inúmeras fortalezas permanecendo detido até 1830.

A Confederação

Em meio a este clima tenso, D. Pedro I nomeou um novo presidente para a província - Francisco Pais Barreto - destituindo Manuel Paes de Andrade, que fora escolhido pelas Câmaras de Olinda, Recife, Igaraçu, Pau-d'Alho, Cabo, Limoeiro e Serinhaém.

Esta decisão abriu caminho para o início do movimento separatista que ficou conhecido como Confederação do Equador. Seus participantes, apresentando-se como "patriotas pernambucanos", discordaram desta medida do imperador, considerando-a autoritária. O movimento ganhou ímpeto, desafiando o poder central, espalhando-se pelas ruas de Recife, inclusive contando com a adesão de alguns estrangeiros.

A revolta, de conteúdo "antilusitano", teve como líder Manuel de Carvalho, que participara ativamente da Revolução de 1817 e que, por conta disto, fora exilado nos Estados Unidos da América tornando-se grande admirador daquele país. A 2 de julho de 1824 Manuel de Carvalho proclamou a Confederação do Equador, uma nova República na América que deveria unir, num mesmo Estado, todas as províncias da Bahia até o Grão-Pará.

O Manifesto da Proclamação da Confederação do Equador declarava, entre outros pontos, que (...) "salta aos olhos a negra perfídia, são patentes os (...) perjúrios do Imperador". Ficava bem clara a idéia que os participantes faziam do monarca, e temiam os rumos que o Império tomaria após a outorga da Constituição de 1824.

A tensão aumentava neste movimento, acentuadamente urbano e popular, de caráter mais democrático do que os anteriores movimentos nativistas. Era, por exemplo, muito diferente da Revolução Pernambucana de 1817, liderada por proprietários de escravos e de terras, comerciantes locais e muitos militares, que entendiam estar sendo explorados pelos portugueses da "nova Lisboa".

Na descrição da viajante Maria Grahan, o ambiente na província pernambucana, guardadas as proporções, era semelhante ao que se sentia na França ao tempo da Revolução Francesa. Muitos olhos espreitavam e muitos ouvidos permaneciam atentos, pelos cantos, sempre à espera de armadilhas e traições.

Porto de Recife, fechado para o desembarque de navios negreiros
Para organizar o Estado que surgia convocou-se uma Assembléia, que elaborou um projeto constitucional que priorizava o Poder Legislativo. Suspendia também o tráfico negreiro no porto de Recife (...) "até que a soberana Assembléia resolva este Negócio", considerando ser este (...) "um comércio, que está em completa oposição com os princípios do Direito Natural, e as luzes do presente século."

Este ponto, porém, causou um fracionamento no movimento pois atingia em cheio os poderosos interesses locais, como já ocorrera em 1817. Por outro lado, a participação de camadas populares - homens livres, pretos, mulatos e militares de baixa patente - colocou em pauta outros enfoques que alarmaram a população branca que compunha a elite local.

Jean Baptiste Debret, Homens Livres e Pobres e Escravos, Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, 1834
Com o radicalismo ganhando espaços maiores a classe dominante, que aderiu ao movimento, recuou rompendo a união que mantinha com a Confederação. Assim como em 1817 não era apenas o Governo Imperial que se sentia ameaçado mas os interesses locais dos proprietários de escravos e de terras, dos comerciantes portugueses, dos burocratas...

A Repressão à Confederação do Equador

Frei Caneca
Uma violenta repressão iniciou-se em agosto de 1824. As tropas do Governo avançaram e, com sucessivas vitórias, puseram fim à Confederação do Equador em 29 de novembro de 1824. As instruções passadas pelo Governo imperial diziam (...) "não admitir concessão ou capitulação, pois a rebeldes não se deve dar quartel".

A maior parte dos líderes do movimento, em Pernambuco e nas outras províncias, foi presa e julgada por tribunais militares. Frei Caneca foi acusado, entre outras ações, de (...) "aprender ofício de soldado (...) de ser declamador (...) de ser capitão de guerrilhas, (...) de fugir com os rebeldes e, na debandada de ser preso".

D. Pedro I mostrou-se irredutível em relação ao cumprimento das penas dos condenados à morte. Não atendeu a nenhum apelo irritando-se com a insistência dos pedidos. Frei Caneca, condenado à forca, acabou sendo fuzilado por soldados das tropas imperiais em 13 de janeiro de 1825, pois os carrascos pernambucanos negaram-se a cumprir a sentença. O historiador Nelson Werneck Sodré comenta que Frei Caneca às vésperas da morte, compôs alguns versos sendo que os últimos diziam: "A vida do patriota não pode o tempo acabar..."

Fonte: www.multirio.rj.gov.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário