terça-feira, 22 de novembro de 2011

Entre o original e o genérico

A avassaladora vitória da direita nas eleições espanholas enseja uma discussão pertinente para a esquerda em todo o planeta. A adoção da agenda e do receituário do FMI, Banco Central Europeu e União Europeia no enfrentamento da crise econômica é o caminho mais curto rumo ao cadafalso político. Corte de gastos sociais, fechamento de postos de trabalho, redução dos salários dos servidores e das aposentadorias, além de  empecilhos dos mais diversos para a sua concessão, formam o coquetel venenoso de medidas imposto por governantes europeus de A a Z. Trocando em miúdos, isso significa punir as vítimas da crise e poupar seus responsáveis : o sistema financeiro errante e desregulado, respaldado por Sarkozy, Merkel, Cameron e cia. A desgraça de sociais democratas como Sócrates, Papandreou e Zapatero foi ter embarcado nessa, pois o eleitor europeu tem sido implacável : entre os dois remédios amargos compostos pelo mesmo princípio ativo, ele tem desprezado o genérico e optado pelo original, mesmo que o velho travestido de novo traga de volta ao poder a direita mais reacionária.

Resistir à chantagem parece ser o ponto crucial dos países da zona do euro. As ameaças de serem expurgados da moeda comum e abandonados à própria sorte são repetidas dia e noite por autoridades da UE, pelos banqueiros e seus analistas de plantão e pelos "donos do euro", o presidente francês e a primeira ministra alemã. José Sócrates, do Partido Socialista de Portugal, foi o primeiro a ser defenestrado pelos eleitores. Em seguida, a crise levou de roldão também os socialistas gregos e espanhóis. Ainda bem que sobrou também para o boquirroto sultão da direita italiana, o magnata das comunicações Sílvio Berlusconi, agora empurrado para as barras dos tribunais sem as prerrogativas de chefe de governo. Não são alvissareiras, porém, as primeiras informações sobre os rumos a serem seguidos pelo governo do prestigiado professor Mário Monti. Sua seriedade no trato da coisa pública deve tirar o governo italiano das páginas policiais, mas não vale um tostão furado a aposta de que ele pretende enfrentar o rolo compressor da banca e da UE.

Enquanto a direita avança, a troika Banco Central Europeu, FMI e União Europeia protagoniza uma sucessão de cenas que se não fossem trágicas seriam cômicas. São profissões de fé, reuniões sem fim, acalorados discursos, promessas de criação de mecanismos de resgate dos países insolventes e juras de aumento das verbas do BCE e do FMI destinadas ao refinanciamento dos devedores. Tudo sem nenhuma consequência prática. Ao fim e ao cabo, se limitam a repetir o mantra de que " a Grécia tem que tomar as medidas necessárias ( leia-se mais arrocho e cortes sociais) se quiser fazer jus à segunda parcela do socorro financeiro; que a Irlanda tem de seguir o mesmo caminho; que só reta a mesma alternativa para a Itália, Portugal, Espanha e quem mais chegar."

Nem a recessão que já atinge a maioria dos países da zona do euro nem o desemprego, que ganha contornos de verdadeiro drama social no continente, assolando, por exemplo, nada memos que 22% dos espanhóis, e tampouco o risco iminente de contaminação, em menor ou maior escala, de toda e economia mundial  parece sensibilizar os líderes europeus, cuja única e obcessiva preocupação é a construção de uma saída para a crise mais palatável possível aos interesses dos rentistas, no fundo seus senhores. A população e a economia global que se danem. Se contássemos, por outro lado, com uma mídia menos partidarizada, e minimamente voltada para a verdade factual, as medidas anticíclicas dos governos Lula e Dilma, com base no estímulo ao mercado interno, na ampliação do crédito pelos bancos públicos e nas desonerações dos setores intensivos em mão de obra estariam sendo cantadas em prosa e verso como uma alternativa soberana, popular e eficaz contra o "monstro devorador" da crise econômica.

Um comentário:

  1. Interessante quando se fala do que é a mídia no Brasil e seu nefasto papel na cobertura da crise. Semana passada vi de passagem um comentário do "genial" analista Carlos Alberto Sardemberg, no qual ele citava que a verdadeira responsabilidade do Brasil não ter sentido os efeitos da crise foi dos governos anteriores que adotaram as tais medidas de austeridade muito antes, promovendo as privatizações, por exemplo.
    Uma linha de pensamento como essa é mais do que não enxergar a realidade, é mau caratismo mesmo.
    Abraços

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