quarta-feira, 14 de março de 2012

Grandes de alma pequena

Chega a ser constrangedor o silêncio dos grandes clubes brasileiros depois da queda da ditadura de Ricardo Teixeira. Como explicar que justamente os que foram mais lesados ao longo dos últimos 23 anos não sejam capazes de uma tênue manifestação de regozijo pela janela que se abre para o futuro? É do conhecimento público que o reinado de Ricardo Teixeira se sustentou nos acordos nebulosos, no toma-lá-dá-cá com as federações. Tudo isso, sempre de costas para os interesses dos responsáveis pela maior paixão popular e pela lucratividade de um negócio que gira bilhões : os clubes de maior expressão do nosso futebol. A saída de Teixeira acabou jogando luz e trazendo à tona a cumplicidade, para dizer o mínimo, entre essa cartolagem e a CBF.

Para não cometer injustiças, cabe o registro  de que o silêncio tumular foi quebrado por dois presidentes de clubes cariocas : os mandatários do Botafogo e do Fluminense. Ambos, porém, lamentaram a saída de Ricardo Teixeira. Apenas o presidente do Santos, Luis Álvaro dos Santos, demonstrou sintonia com o momento histórico, conclamando os clubes para um processo de união e reformulação do futebol brasileiro. Algum ruído nesta direção também foi emitido pelo ex-presidente do Flamengo, Márcio Braga. E foi só.

A avaliação de que nada muda no futebol brasileiro até 2015 – quando termina o mandato do larápio de medalhas José Maria Marin, o vice que substituiu Teixeira pelo critério da idade e foi flagrado afanando medalhas destinadas ao jogadores do Corinthians que ganharam a Copa São Paulo de juniores – peca por uma dose exagerada de simplismo e por uma lógica excessivamente linear. Uma série de outras variáveis precisa ser levada em conta. Por exemplo :

- Na minha opinião, não é correto menosprezar a saída de Teixeira devido ao perfil de quem o sucedeu. Com Teixeira vai-se uma era, um conceito, uma filosofia, um período de decisões autocráticas com a marca inegável do ex-presidente.

- Vários questões já começam a ser debatidas pela imprensa, diante da omissão dos clubes : 1) Quais são as chances de crescimento do movimento de algumas federações visando a convocação imediata de eleições na CBF? ; 2) É ou não verdade que José Maria Marin, homem de idade avançada, pretende ficar apenas um curto período no poder, passando a bola para outro vice; 3) Que implicações a queda de Teixeira tem para o comando da seleção brasileira?  4) Se o ex-presidente do Corinthians, Andres Sanches, diretor de seleções da CBF, se enfraquece com a saída do padrinho, é razoável supor que Mano Menezes pode estar com a cabeça a prêmio, uma vez que José Maria Marin é ligado a Marco Pólo Del Nero, presidente da Federação Paulista de Futebol e profundo admirador do técnico Muricy Ramalho.

- As incontáveis denúncias de corrupção contra Teixeira, aqui e lá fora, trouxeram enorme desgaste não só para ele próprio, mas também para, em maior ou menor grau, todos os integrantes da direção da CBF. Se até João Havelange foi forçado a submergir, que dirá o entorno de Ricardo Teixeira na confederação, formado por pessoas com incontornáveis déficits de credibilidade.

- Mesmo a contragosto os clubes podem  ser empurrados pela realidade, pelos milhões de amantes do futebol e pela sociedade de uma forma geral a tomarem as rédeas do seu destino, seja assumindo o controle da CBF, seja organizando por conta própria seus torneios e campeonatos.

- Não dá para deixar de reconhecer o papel importante cumprido pelo movimento nacional Fora Ricardo Teixeira no processo que levou à renúncia do presidente da CBF. Quem pode garantir que não surgirão outras campanhas cobrando as transformações que o futebol brasileiro tanto precisa ?

Como se vê, em que pese a realização de uma Copa do Mundo dentro de dois anos possa até atrasar a reformulação necessária ao futebol brasileiro, ela acabará se consumando. E, por paradoxal que pareça, queiram os grandes clubes ou não. Quando o cavalo da história passar encilhado, só vai lhes restar montar.




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