quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Um vergonhoso tribunal de exceção

Não que eu esperasse que a maioria dos ministros do STF tivesse estofo moral para enfrentar o PIG; não que acreditasse na autonomia de suas excelências diante da pressão da "opinião publicada"; não que alimentasse esperanças cidadãs em relação a um ministro que concede dois habeas corpus em menos de 24 horas a um Daniel Dantas flagrado em ato explícito de suborno; não que tivesse um pingo de orgulho de uma Corte Suprema que corroborou a anistia a torturadores, crime de lesa-humanidade condenado pelos tribunais internacionais. Contudo, os argumentos usados por ministros do Supremo para condenar até agora os reús do mensalão são uma afronta à causa democrática, uma violação inaceitável de premissas do direito penal e do código de processo penal, um atentado a garantias constitucionais muito caras à humanidade.

Pois em pleno Século XXI, o ministro Luiz Fux, ao justificar o voto, revelou seu grau de apreço pelo Estado de Direito Democrático, fazendo corar Temis, a deusa grega da justiça. No vale tudo para incriminar os réus, disse com todas as letras que o ônus da prova não cabe ao acusador, cabendo, pasmem, ao acusado apresentar provas de sua inocência. Só uma mente turvada pela obsessão condenatória pode conceber barbaridades jurídicas como essa. Já que tinha enveredado nas trevas da parcialidade de coloração política, Fux foi além, criticando os advogados de defesa por cobrarem a apresentação de provas o tempo inteiro. Por fim, entre uma citação pernóstica e outra em latim, ele atacou o princípio cívico e republicano da presunção da inocência, degradando outra conquista secular da cidadania.

Fux agiria da mesma forma se os reús fossem banqueiros, latifundiários, grandes empresários, donos do monopólio midiático ou políticos de direita ?

O mais grave é que as teses de excessão defendidas por Fux, que na verdade se limitou a endossar a peça de acusação do prevaricador-geral da República ( Demóstenes e Cachoeira que o digam) e o voto cheio do ódio do relator Joaquim Barbosa, foram, em linha gerais, encampadas pelos demais ministros que votaram pela condenação de todos, exceto Guschiken. Provas deram lugar a "evidências" e as 600 testemunhas foram esquecidas em nome de conjecturas e ilações. Já a  razão de ser da Ação Penal 470, a compra de congressistas, foi mandada às calendas desde o início do julgamento, quando o conluio mídia/STF percebeu o quão insustentável era.

Todas essas manobras, casuísmos e pulverização de garantias constitucionais seriam consumadas se os réus fossem banqueiros, latifundiários, grandes empresários, donos do monopólio midiático ou políticos de direita?

Vale registrar o quanto fez sucesso entre ministros e ministras, sendo usado à larga, o chamado voto-ignorância. Demonstrando um conhecimento precário e rudimentar dos meandros da administração pública (concorrência, licitação, contratação, subcontratação, etc, etc...) - e do mercado publicitário ( bônus de demanda, campanhas, contas, etc. etc...) os ministros deram um show de arrogância, proferindo sentenças condenatórias a esmo sem o devido conhecimento da causa em tela. Caso buscassem se informar melhor sobre as relações entre os governos e as agências de publicidade, saberiam que nem tudo que é desdobramento de contrato é corrupção, que subcontratar muitas vezes não é igual a roubar.

Esses tipos de contrato seriam vistos como criminosos se os reús fossem banqueiros, latifundiários, grandes empresários, donos do monopólio midiático ou políticos de direita ?

E o espetáculo continua hoje, amanhã, depois, entra por setembro, outubro... pouco importa. Os votos e as sentenças são absolutamente previsíveis. Escrevendo uma das páginas mais tristes e repugnantes de sua história, o STF, na minha opinião, já disse a que veio :  "às favas com quaisquer constrangimentos em abolir garantias constitucionais consagradas por povos e nações civilizadas. O negócio é agradar aos senhores da Casa Grande e condenar este bando de petistas".

No lugar dos réus, eu não hesitaria em denunciar o STF à Corte Interamericana de Direitos Humanos, da OEA.

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