Por Rodrigo Vianna, no Escrevinhador
Ainda em 2011, recém-iniciado o governo Dilma, ficaram claras as
estratégias do governo vitorioso e da oposição derrotada pela terceira
vez. Do lado petista, Dilma caminhou (ainda mais) para o centro,
numa tentativa de conquistar setores urbanos (da nova e da velha
classes médias) que se haviam afastado do PT durante os dois mandatos de
Lula. Dilma aceitou a pauta da “faxina moral”, investiu na imagem da
“gerente”, e evitou qualquer conflito com a mídia conservadora que é a
verdadeira comandante da oposição no Brasil.A presidente emitiu sinais de que concentraria toda sua energia na
mudança de paradigma econômico: reduzir os juros, e abrir espaço para
uma nova fase de desenvolvimento sem a hegemonia ostensiva do setor
financeiro (o que inclui também as tentativas de reduzir os custos de
produção, como no caso da energia). O arranjo adotado durante os dois
mandatos de Lula, com juros altos e programas sociais massivos
(Bolsa-Família, crediário popular, recuperação do salário mínimo,
Pro-Uni), serviu para manter os rentistas e grandes empresários calmos –
ao mesmo tempo em que trouxe para o PT imensas massas “descamisadas”
que, no passado, não votavam no partido de Lula.
Escrevi, em 2011, que a escolha parecia inteligente: o PT ja tinha os
setores de trabalhadores organizados (que votam na aliança de esquerda
desde os anos 80) e as grandes massas que o governo Lula tirou da
miséria. Dilma conquistaria a classe média, reduzindo ainda mais a
margem de manobra da oposição.
O risco, no entanto, era evidente: tudo ficar igual. Se Dilma assume o
discurso tucano do “gerenciamento”, afastando-se de qualquer confronto,
evitando a “politização”, qual seria a diferença – no fim das contas –
de votar num tucano ou num(a) candidato(a) do PT, em 2014?
Fragilizada pela terceira vitória lulista, a oposição midiática e o
consórcio PSDB/DEM/PPS aceitaram o jogo, mas com uma nuance matreira: passaram a dividir PT, Lula e Dilma em 3 fatias.
Lula seria o “atraso” populista, o PT seria quase uma ”quadrilha”, e
Dilma seria a única aceitável nesse tripé – a gerente confiável.
Se Dilma tomara a decisão de caminhar para o centro (abandonando a
Reforma Agrária, engavetando a “Ley de Medios” que Franklin deixou
pronta no fim do governo Lula, jogando no lixo avanços na Cultura da era
Gil/Juca, entre outros pontos), a oposição tratou de atraí-la cada vez
mais: “venha com a gente, longe de Lula e do PT você será bem tratada…”
A sedução, em parte, parece ter funcionado.
Assim, terminamos 2012 com a estratégia do “fatiamento” em pleno vapor: o
PT recebe o carimbo de “quadrilha” no STF (o que não impediu que o
partido conquistasse mais Prefeituras, incluindo a gigantesca São Paulo;
mas foi suficiente para evitar uma vitória ainda mais consagradora para
a sigla de Lula, que teve recuos inesperados em Salvador e Fortaleza, e
resultados apenas razoáveis em cidades médias de todo o país), Lula
vira o alvo no caso Rosemary (que, por outro lado, mostra o mergulho de
parte do petismo na inaceitável tradição de velhacarias e
patrimonialismo brasileiros).
E Dilma? Os geniais condutores da estratégia de comunicação da
presidenta acham que ela se salvará sozinha dos ataques. Acreditam – ou
fingem acreditar – no canto de sereia da velha mídia conservadora…
Gostam de ver Dilma apontada como a condutora de um “novo PT”.
Não é preciso ser muito esperto para perceber que não há “novo” ou
“velho” PT. O que existe é o PT – com sua história de erros e acertos. O
velho e o novo ganham juntos, ou naufragam juntos. A arena da oposição é
o “gerenciamento” e o “moralismo” udenista. A arena da centro-esquerda é
a política, a defesa do Estado, das reformas democráticas e dos
programas sociais. Dilma parece ter-se esquecido disso. Ou achou que
seria possível manter isso tudo em banho-maria, enquanto se concentrava
no rearranjo da economia?
Agora, em 2013, veremos iniciar-se a terceira etapa do “fatiamento” – que não foi concebido por Joaquim Barbosa, mas por Mervais e outros quetais. Enfraquecida a imagem de Lula e do PT
(atenção, não estou dizendo que a imagem esteja irremediavelmente
abalada; as pesquisas mostram que tanto Lula como o PT seguem como
referência de defesa dos interesses populares, mas o partido está
claramente na defensiva nos últimos meses), veremos se Dilma terá força para reagir aos ataques.
E eles já começaram. ”Mequetrefe”, diz um colunista sobre a
presidenta. Outro comemora o “ano perdido” (2012) na economia.
Inicia-se, no noticiário, um giro cuidadoso para incluir Dilma – ao lado
de Lula e do PT – na mira dos ataques.
PT/Lula/Dilma juntos são fortíssimos.
Quase imbatíveis. Sozinha, Dilma ainda é forte. Mas o jogo fica
embolado. O povo teria que escolher entre uma “gerente” petista ou um
“gerente” tucano. O PSDB já percebeu que há espaço pra avançar agora.
FHC lançou Aécio. Nas pesquisas, ele está muito atrás de Dilma. Mas
pesquisa a essa altura não diz muito. O que importa é o arranjo
político.
Se o PSDB abandona o discurso raivoso da era Serra, e adota um tom
mais centrista, a massa de eleitores pode se perguntar: vamos eleger
pela quarta vez um(a) presidente(a) petista? Mesmo com tantos
escândalos? Se PSDB e PT ficam parecidos, será que não é melhor apostar
dessa vez naquele partido que – na mídia – não está carimbado como
“quadrilha”? A avenida por onde os tucanos podem avançar é essa: ganhar
dos eleitores o benefício da dúvida, o mesmo que o STF deixou de lado em
2012…
Ah, mas os tucanos tem outro carimbo – governam para os ricos, são
privatistas e só pensam em agradar os empresários. Lula e o PT, não –
esses governam para o povo. Mas quem está falando de Lula e do PT? Dilma
não se afastou dos dois, ao traçar sua estratégia inicial há 2 anos?
Isso tudo, e mais o crescimento medíocre da economia pelo segundo ano
seguido (a “gerente” não gerenciou?) permitem que a oposição – que
respirava por aparelhos – ganhe ao menos o benefício de deixar o eleitor
em dúvida. PT de novo? Será que não vale a pena mudar?
Se a eleição de 2014 for acirrada - como imagino que será – Dilma vai
enfim perceber o erro que foi ter-se afastado das bases e das bandeiras
históricas de Lula e do PT. Sacar na última hora o discurso de que
“tucano é privatista” pode não colar – tantos anos depois de FHC ter
saído do poder.
A oposição conseguiu fatiar PT, Dilma e Lula. Eles
conseguirão se reagrupar - no imaginário popular – em 2014? Tempo para
isso existe, de sobra. Mas o lulismo precisa sair da defensiva. Trocar
“gerenciamento” por política.
Os tucanos querem Aécio para ganhar, apostando num “pós-Lula”. Mas
não existe “pós-Lula”. O que está em curso é uma tentativa de derrotar o
lulismo. No presente e na história. A ideia é afogar Lula e o PT num
“mar de lama” tão intenso quanto aquele que levou Vargas ao suicídio em
1954 . Dilma acha mesmo que pode sair “limpinha” dessa batalha? Não vai
funcionar…
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