Por Amir Khair, publicado no Estadão
Nunca foi tão tumultuada e tensa a decisão do Copom de quarta-feira
passada. Há alguns meses já havia forte pressão do mercado financeiro
pela elevação da Selic. Argumentavam que a inflação nos últimos 12 meses
estava se elevando e iria romper o teto da meta. Omitiam que a inflação
mensal era cadente desde o início do ano: janeiro, 0,86%; fevereiro,
0,60%; e março, 0,47%.O Banco Central (BC) se contrapunha a essa pressão
arguindo “cautela”, pois no exterior o preço das commodities está
desabando e os dados internos são de queda mensal da inflação.
Mais
recentemente, começaram algumas análises a defender que a inflação só
cairia se o mercado de trabalho desaquecesse, ou seja, os salários
tinham de crescer menos e, para isso, recomendam elevação no desemprego.
Outras análises sugerem que o governo deveria diminuir despesas e
segurar o crédito. Ambas visam a redução da atividade econômica como
terapia de combate à inflação.A presidente se contrapôs a isso em
pronunciamento no dia 27 de março, quando esteve na África do Sul,
afirmando que não iria sacrificar o crescimento para combater a
inflação.
Imediatamente, a parcela do mercado que ainda apostava na elevação da
Selic mudou para a manutenção dessa taxa. Mas o mercado financeiro não
recuou, e passou insistentemente a tachar o BC de leniente com a
inflação, de ter perdido a autonomia e de não mais ancorar as
expectativas inflacionárias.
Apesar dessa pressão e da forte elevação dos alimentos in natura
(responsáveis por 43% do IPCA deste ano), a maioria dos analistas não
previa alteração na Selic, segundo o jornal Valor Econômico
em matéria do dia 12 último. Nesse mesmo dia, o ministro da Fazenda e o
presidente do Banco Central deram declarações que reviraram as
expectativas, e todo mundo passou a prever que o Copom iria aumentar a
Selic. É possível que essas declarações tenham ocorrido por ordem do
Planalto, pois a pressão política foi intensa na mídia, repercutindo a
elevação de alguns alimentos in natura, com destaque para o tomate,
tomado como símbolo da inflação.
Erro. Ao elevar a Selic o objetivo do BC é esfriar a
economia, partindo do pressuposto de que há excesso de demanda em
relação à oferta. A pergunta é: a economia está aquecida? Seguramente,
não. Saímos de um pífio crescimento de 0,9% no ano passado, depois de um
fraco crescimento de 2,7% em 2011, índices bem abaixo do crescimento
médio mundial (3,9% em 2011 e 3,1% em 2012). Os primeiros indicadores
para este ano apontam para crescimento no País até 3%, abaixo do
crescimento mundial previsto pelo FMI de 3,3% segundo o World Economic Outlook, publicado na terça-feira.
Demanda x oferta. Mas por que há análises que
apontam que a inflação é devida ao excesso de demanda em face da oferta?
É que citam, para exemplificar, o setor de serviços, cuja inflação nos
últimos 12 meses atingiu 8,4%.
Esse setor quase não sofre concorrência externa e, assim, reajusta
preços de acordo com a demanda e essa, de fato, tem superado nos últimos
anos a oferta, por causa do forte crescimento da classe média ocorrida
especialmente nos anos dourados de 2004/2008, quando a economia cresceu
em média 4,8% ao ano. O que não dizem essas análises é que o setor de
serviços representa apenas 25% do IPCA.
Para os bens comercializáveis, que influem metade do IPCA, há
claramente excesso de oferta em relação à demanda, seja pela elevada
ociosidade nas empresas, seja pela oferta internacional, muitas vezes
superior à doméstica. Assim, para o conjunto da economia, o que se
verifica é excesso de oferta em relação à demanda.
Perspectivas. É necessário sair do campo político de
pressões e contrapressões e procurar ver alguns importantes
condicionantes dos preços nos próximos meses. Não arrisco previsões além
de 3 a 4 meses, pois principalmente o cenário externo sofre alterações
por vezes importantes, surpreendendo a todos.
Há que considerar que: 1) o mundo é desinflacionário em commodities. O
índice que as mede vem despencando como reflexo do crescimento mundial
se reduzindo a cada avaliação; 2) os alimentos, que foram responsáveis
por 76% da inflação deste ano, já começaram a cair fortemente, como
apontou o IGP-10 no dia 16; 3) apontado como o vilão da inflação, o
preço do tomate despencou 75% no dia 17 (Estadão,
18/4); 4) a previsão de experientes analistas de preços é de que este e o
próximo mês serão de inflação baixa; 5) o governo continuará a
desonerar produtos contribuindo para a redução de custos e preços e; 6)
apesar do fluxo cambial fortemente negativo, o governo segura com mão de
ferro o câmbio para manter artificialmente baratos os produtos
importados.
É de se esperar, portanto, arrefecimento da inflação nos próximos
meses, e isso independentemente do BC e da aposta do mercado financeiro
de aumentos de 0,25 ponto porcentual em cada uma das próximas quatro
reuniões do Copom.
1.º no ranking. Segundo dados básicos da Bloomberg e
boletim Focus, o Brasil reconquistou a liderança do maior juro nominal
do mundo, junto com a Índia. Pior ainda, no juro real (excluída a
inflação) prefixado 12 meses à frente, o Brasil já era líder mundial
absoluto com 2,8% antes da reunião do Copom e, se continuar a elevar a
taxa Selic, vai se isolar cada vez mais.
1.º a elevar. O Brasil é o primeiro país a elevar o
juro desde setembro de 2012, quando o Banco Central da Rússia aumentou a
taxa. Todas as decisões de bancos centrais são por estabilidade ou
redução nos juros devido à fraca atividade econômica, que ainda é mais
fraca no Brasil.
Essa decisão do Copom e, caso siga o que pauta o mercado financeiro,
de mais elevações da Selic, gera mais despesa com juros no governo
federal, e quem paga essa conta é o contribuinte. É necessário que o
governo, que não conseguiu resistir à pressão do mercado financeiro,
diagnostique melhor o comportamento futuro da inflação para evitar nova
decisão equivocada.
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